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Autismo: Os aprendizados e as alegrias que o pequeno Davi proporciona à família

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Após ‘perder o chão’ com o diagnóstico, a mamãe Ana Carla disse que a família passou a ver felicidade nas pequenas coisas aprendidas pelo filho, como cada palavrinha pronunciada

Entrevista e texto: Natália Tiezzi. Fotos: arquivo pessoal

Dúvidas, incertezas, medos. Talvez esse misto de sentimentos defina um pouco do que uma família sente ao receber o diagnóstico de que o filho ou filha é autista. O Autismo ou Transtorno do Espectro Autista — TEA — é um transtorno do desenvolvimento que leva a comprometimentos na comunicação e interação social, englobando comportamentos restritivos e repetitivos, porém, apesar dos desafios que impõe, ele também traz aprendizados e alegrias ao convívio familiar.

Prova disso é o que aconteceu com a família do pequeno Davi, de 4 anos. “De primeiro momento receber um diagnóstico tão incerto nos trouxe muita tristeza e desespero, mas com o passar do tempo conseguimos entender que o Davi nasceu na família que ele precisava e que nós como família, temos o filho que necessitamos. Então, o autismo foi e tem sido muito positivo para nós; passamos a ver felicidade nas pequenas coisas, cada palavrinha que ele fala, a cada evolução que, aos olhos de outras pessoas são coisas corriqueiras, aos nossos olhos é graça de Deus!”, destacou a mamãe de Davi, Ana Carla dos Santos S. Moreira.

Pedadoga e Pós Graduada em Educação na Perspectiva do Ensino Estruturado para o Autista, Ana Carla destacou que desde muito pequeno Davi tinha um desenvolvimento mais lento do que das outras crianças. “E eu, como mãe, já sentia que algo estava diferente no seu desenvolvimento. Davi, assim como outras crianças autistas, tem sim suas limitações, necessita sim de cuidados, mas é uma criança como todas as outras. Tem sentimentos e sente tudo com mais intensidade; quer interagir, quer ter amigos, enfim como todas as outras crianças”, afirmou.

Confira, abaixo, a entrevista na íntegra, cujo objetivo é mostrar a visão materna diante do autismo, com todas as dificuldades e dores, mas sempre com fé e otimismo diante de cada situação do dia-a-dia.

Ana Carla, quando vocês descobriram que o Davi era autista? Ele demonstrava algumas caracteríticas?

Ana Carla Dos Santos S. Moreira: Meu marido, Adilson, e eu notamos desde o início que o Davi tinha um desenvolvimento mais lento que das outras crianças e eu, como mãe, já sentia que algo estava diferente no seu desenvolver. O Davi não engatinhou, ele demorou para sentar, ele começou a balbuciar só com 1 ano e 3 meses, ele não tinha contato visual, chorava bastante, um choro que nada o acalmava. Se colocássemos ele no bebê conforto, ali ele ficava e não reclamava, ele não gostava de colo. E com isso fui percebendo que ele era diferente das outras crianças, e como eu trabalho na área, consegui perceber essa diferença. Conforme o Davi foi crescendo as características foram ficando mais acentuadas, ele passou a fazer movimentos repetitivos com as mãozinhas, a fala não chegava e isso com cerca de dois aninhos. Ele sempre foi para a escolinha desde os seus 5 meses, então eu pensava por falta de estimulo não é, portanto tinha mesmo algo de errado. Na primeira reunião escolar do ano passado a professora dele me chamou e disse que o Davi não conseguia acompanhar o ritmo da sala foi aí que decidimos investigar. E com 2 anos e 5 meses, tivemos o diagnóstico de autismo.

“Davi uma criança como todas as outras. Tem sentimentos e sente tudo com mais intensidade; quer interagir, quer ter amigos, enfim como todas as outras crianças”, afirmou a mamãe

Como ocorreu o diagnóstico?

A princípio pedi um encaminhamento ao pediatra para consultarmos em uma fonoaudióloga, expliquei a ele que o Davi já estava com 2 anos e 5 meses e não dizia ao menos uma palavra e com muito custo ele me encaminhou, pois até então ele acreditava que o Davi estava dentro das normalidades de desenvolvimento. Fomos à fono e na primeira consulta a profissional já deixou uma “deixa” de que algo estava errado devido às características que ele apresentava. Nessa altura do campeonato eu já havia pesquisado de tudo que se relacionava a atraso de desenvolvimento infantil, e em tudo batia com o autismo. Foi aí que passamos por um Neurologista aqui em São José e ele nos encaminhou para um Neuropediatra. O Davi é conveniado a um plano de saúde aqui da cidade e como o convênio não possui profissionais de alta complexidade, fomos encaminhados para a cidade de Ribeirão Petro, lá passamos por uma neuropediatra e na segunda consulta já tivemos o diagnóstico.

E qual foi o seu sentimento naquele momento?

Eu já sabia que algo estava errado no desenvolvimento dele, mas confesso que o diagnóstico naquele momento abriu o nosso chão! Pensávamos: o que vamos fazer? Como isso se dará? A médica foi muito atenciosa, tentou nos explicar tudo, me passou sites de apoio e me lembro como se fosse hoje a sua última fala dela: ‘Bem vinda a maternidade atípica!’ No caminho de volta para casa fui digerindo tudo o que eu havia escutado naquele consultório. É como se tivéssemos que enterrar o “filho sonhado” e se reerguer para um grande desafio, um desafio de uma vida inteira. Quando engravidamos, sonhamos, almejamos que nosso filho nasça, que ele estude em determinada escola, faça determinado esporte… Enfim, sonhamos por eles, e o diagnóstico para mim foi como se fosse um soco no estômago, passei por um processo de “luto” mesmo até eu conseguir aceitar.

O que é, em si, uma criança autista?

Muitos tentam definir o que é ser uma criança autista, o que é estar dentro Espectro, nenhum autista é igual o outro, cada um tem a sua particularidade. O transtorno causa alterações na capacidade de comunicação, interação social e alterações comportamentais, que chamamos de tríade, ou seja, para uma criança estar dentro do Espectro ela por hora traz essas características. Isso explicando a grosso modo! Agora, olhando com um olhar materno, uma criança autista tem sim suas limitações, necessita sim de cuidados, mais é uma criança como todas as outras. Ela tem sentimentos e sente tudo com mais intensidade; ela quer interagir, quer ter amigos, enfim, como todas as outras crianças.

Há algum cuidado especial que tenha que ter com ele? Ele frequenta algum tipo de terapia, etc?

Atualmente o Davi faz terapia ABA (Analise do Comportamento Aplicada) de segunda a sexta-feira, 3 horas por dia. Essa terapia foi um divisor de águas em seu desenvolvimento, pois é através dela que ele está adquirindo a fala, já que ela age diretamente no comportamento da criança, ajuda na aquisição da fala e no cognitivo também. O responsável por essa terapia é o psicólogo Felipe Magalhães Lemos, de Divinolândia, ele tem uma clínica especializada em atendimentos para autistas, o Centro ABATEA. Ele faz também fono uma vez por semana com a Dra. Suzana, aqui de São José, e T.O. duas vezes por semana com a Márcia Biegas, também aqui de São José. Depois que recebemos o diagnóstico decidimos tirar ele da escola regular, só por um tempo, até ele conseguir evoluir e o matriculamos em uma escola especial. Hoje ele está matriculado na Escola de Educação Especial Cáritas, que faz um trabalho incrível com crianças atípicas.

Como é o dia-a-dia do Davi? Como você aprendeu a lidar com essas atipicidades dele?

O dia a dia do Davi é bem corrido e cheio de estimulações. Enquanto outras crianças brincam livremente porque o seu desenvolvimento o propicia isso, por aqui tudo é estimulado: brincadeiras, atividades pedagógicas, a fala – tudo que vamos fazer aproveitamos para estimulá-lo. Ele tem seus momentos livres, mas durante a semana são estímulos, tudo supervisionado pelos profissionais que o acompanham, mas são estímulos. Hoje já me acostumei com essa rotina, acredito que para mim seja mais fácil também, por trabalhar na área, costumo dizer que é um desafio e que estamos vencendo dia após dia.

Consagrados em uma Comunidade, Ana Carla disse que a fé e o auxílio dos membros da Deus Proverá, bem como a família e amigos, ajudaram nos momentos de incertezas e inseguranças

Por ser autista, o Davi apresenta uma saúde mais debilitada?

Algumas crianças autistas apresentam comorbidades, ou seja, outras condições que podem se manifestar junto com o transtorno. 70% dos autistas apresentam outros distúrbios associados ao TEA. O Davi, junto com o transtorno, tem distúrbio do sono, que hoje já se encontra regulado, hiperatividade, e é um pouco compulsivo na alimentação, temos que ficar regrando-o no momento de se alimentar. E através de um mapeamento genético descobrimos a pouco tempo uma síndrome associada, ele é portador da síndrome do X- Frágil, que não traz nenhum malefício à sua saúde. Regulando o sono, a alimentação e treinando sua capacidade de concentração fica tudo ‘dentro dos conformes’ (risos).

A família ou o Davi, especificamente, já sofreram algum tipo de preconceito por ele ser autista? Se sim, como lidou com a situação?

Eu costumo dizer que a informação é tudo. Tenho comigo que uma pessoa que pratica o preconceito, só o pratica por falta de informação; eu costumo dizer que a informação nos forma. Já passamos sim por alguns ‘perrengues’ pela falta de empatia de algumas pessoas, pois o não se colocar no lugar do outro esta cada vez mais difícil e minimizar a dor do outro é cada vez mais frequente na sociedade. Mas, tenho comigo que não é maldade e sim falta de conhecimento, falta de informação, afinal, só conseguimos amar e aceitar o que conhecemos. E se não conhecemos consequentemente vamos falar “abobrinhas” por aí.

Você ou seu marido também passa por algum acompanhamento?

Não passamos por nenhum acompanhamento psicológico. Na escola que ele está tem um grupo de apoio as mães, mas quase não chegamos a frequentar devido a pandemia. Porém a minha religião, a minha espiritualidade nos ajuda muito. Eu e minha família somos consagrados em uma comunidade, a Comunidade Deus Proverá, e recebemos total apoio, tanto com orações como com “ombros” que nos acolheram na hora da dor. E, claro, tivemos apoio também da nossa família e de alguns amigos que estenderam a mão para nos ajudar. Eu falo que Deus nos dá os desafios, mas Ele também envia anjos para nos ajudar.

Para finalizar, que mensagem você deixaria às famílias que tenham crianças autistas?

Hoje cresce cada vez mais o número de crianças com características autísticas, e muitas famílias, principalmente as mães, têm medo de correr atrás de um diagnóstico, mas eu digo e assino embaixo: quanto mais cedo você procura ajuda, melhor é para a sua criança. Não deixem que o medo os paralisem, procurem ajuda: a sua criança precisa de você e dos atendimentos necessários para que ela se desenvolva. Eu escuto muito as mães falarem: ‘a mais o pediatra disse que está tudo bem’.  Eu ouvi isso também, mas, coração de mãe não se engana: se você tem uma “pulguinha atrás da orelha”, corra atrás, não perca tempo. O tempo é precioso para o desenvolvimento de seu filho. Quanto mais nova a criança começar a ser estimulada menos ela sofrerá!

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