“Inverno será habitual, com pouca chuva e algumas frentes frias”, destaca o climatólogo Pedro Fontão
Ele também falou que devemos estar mais atentos às mudanças climáticas que estão acontecendo para planejarmos o próprio futuro
Entrevista e texto: Natália Tiezzi
O inverno 2020 teve início oficialmente no dia 20 de junho e se estenderá até 22 de setembro. Além das quedas de temperatura, algumas vezes mais bruscas, o período gera muitas incertezas, principalmente com relação à agricultura, já que boa parte da colheita de alguns gêneros acontece nos próximos meses.
Antes mesmo da estação chegar, no final de maio, a região sudeste sentiu as temperaturas despencarem por conta de uma frente fria, entretanto, foi um período isolado. Em entrevista ao www.minhasaojose.com.br, o rio-pardense e climatólogo Pedro Augusto Breda Fontão, falou sobre o que esperar do inverno, mais especificamente no estado de São Paulo.
Pedro reside atualmente no Paraná, é geógrafo, doutor na área de Climatologia Geográfica pela Universidade Estadual Paulista (PPGG-IGCE-UNESP) e atualmente Professor Adjunto no Departamento de Geografia do Setor de Ciências da Terra da Universidade Federal do Paraná (DGEOG/CT – UFPR), além de coordenador do Laboratório de Climatologia (LaboClima/UFPR).
“Nesse ano, como estamos em uma situação de neutralidade climática, os modelos estão indicando chuvas próximas ou ligeiramente abaixo do habitual e algumas ondas de frio, alternando-se com dias mais quentes e secos, sobretudo no final de agosto e início de setembro. Entretanto, já nas próximas semanas, sentiremos as temperaturas um pouco mais baixas”, disse.
Confira, abaixo, a entrevista na íntegra.
Pedro, o que podemos esperar do inverno neste ano, principalmente aqui na região sudeste?
O inverno no Hemisfério Sul começou oficialmente no dia 20 de junho, e terminará somente no dia 22 de setembro desse ano. Na região sudeste, e mais especificamente no estado de São Paulo, temos normalmente dias ensolarados, com temperaturas mais amenas e noites mais frias, além de pouca ocorrência de chuvas no período. É bom ressaltar que as chuvas no inverno ocorrem durante a passagem das Frentes Frias, sendo possível prever com certa antecedência e, após a passagem destes sistemas, podem suceder quedas significativas na temperatura através de uma onda de frio. Nesse ano, como estamos em uma situação de neutralidade climática, os modelos estão indicando chuvas próximas ou ligeiramente abaixo do habitual e algumas ondas de frio, alternando-se com dias mais quentes e secos, sobretudo no final de agosto e início de setembro.
Precisamos nos precaver para algum período de frio muito intenso?
Sim, há a possibilidade de ocorrência de ondas de frio, principalmente entre julho e agosto desse ano. No entanto, é importante ressaltar que esse frio intenso permanece normalmente por poucos dias (em sequência), e a queda na temperatura ocorre principalmente durante a madrugada/início da manhã. Em São José do Rio Pardo, por exemplo, não é comum ocorrer temperaturas negativas (abaixo de 0°C), todavia já tivemos frio intenso nesse ano: a passagem de uma Frente Fria no dia 24 de maio deu sequência à uma onda de frio que atingiu seu ápice no dia 27, onde registrou-se uma temperatura mínima de 4,1°C* durante a madrugada e geadas na zona rural da região. * Fonte: Estação Meteorológica da Cooxupé – Sismet-Cooxupé. Disponível em: http://sismet.cooxupe.com.br:9000/. Acesso em: 23 jun. 2020. Atualmente, a previsão do tempo consegue alertar para o avanço de massas de ar polar (de potencial para frio mais intenso) com alguns dias de antecedência.
O inverno será bom ou ruim para a agricultura? Quais culturas sofrerão mais nesta estação?
Para a agricultura, o ideal seria um inverno dentro da normalidade, sem eventos extremos e grandes surpresas para o agricultor. No Sul do Brasil, por exemplo, estamos passando por uma forte seca, que tem afetado a produção agrícola. Dito isto, a previsão deste inverno para o Sudeste encontra-se próximo ao habitual, talvez com uma leve redução nas chuvas, que podem afetar levemente a produção. Entretanto, deve-se ficar atento às ondas de frio, principalmente se houver previsão de geadas, que tem o potencial para afetar algumas culturas (hortifruti, café, etc).
É verdade que o isolamento social está contribuindo para uma melhora no Meio Ambiente, inclusive na questão do clima?
Infelizmente estamos passando por uma pandemia global, e o isolamento social ainda é a principal ferramenta para lidar com a Covid-19. Sim, é verdade que o isolamento social contribuiu para melhorar o ambiente em alguns locais, como, por exemplo, a qualidade do ar de algumas metrópoles. No entanto, é importante ressaltar que se trata apenas de um fator temporário, que não irá resolver os problemas ambientais a longo prazo.
Como podemos continuar contribuindo para melhorar a qualidade do ar, dos rios e, consequentemente contribuindo também com o clima, após o isolamento social?
Basicamente adotando medidas sustentáveis a longo prazo e defendendo a adoção de medidas que favoreçam o desenvolvimento econômico sem deixar de lado a preservação ambiental, afinal, ambas devem e podem caminhar juntas. Em pequenas escalas, cada um também pode fazer a sua parte: plantar (e preservar) um jardim na sua casa, separar os materiais reutilizáveis, manter a cidade limpa, averiguar a destinação correta do esgoto de sua residência, etc. São pequenas ações que, se todos fizerem, teremos um país melhor para a próximas gerações.
Por que muita gente, principalmente os mais velhos, costumam dizer que “antigamente o inverno era mais frio”?
Atualmente, temos um cenário bastante associado às Mudanças Climáticas, teoria cada vez mais defendida e aceita por cientistas ao longo do Planeta, e que certamente irá acarretar profundos debates globais no futuro. Por isso é comum escutarmos de pessoas mais velhas em São José: ‘o inverno antigamente era mais frio’. Um dos fatores que justificariam tal frase é o aumento da área urbana no município, pois muitas pessoas viviam na zona rural, em localidades um pouco mais frias. Outro fator, é a ‘memória meteorológica’ das pessoas, algo que, segundo alguns pesquisadores, o ser humano tem dificuldades em recordar com precisão a dinâmica das variáveis climáticas. No entanto, será que só isso explicaria essa frase?. Um dos papéis da Climatologia é exatamente esse: continuar monitorando os registros de dados e a intensidade das ondas de frio no nosso inverno.
Para finalizar, qual a importância de uma análise mais aprofundada sobre o assunto clima?
Clima não é somente previsão do tempo, como muitos podem pensar. Falar em clima envolve o estudo de inúmeros fatores que interferem diretamente no mesmo e que cada vez mais devemos estar atentos. Neste ínterim, gostaria de apresentar uma notícia recente e que saiu nos principais jornais nos últimos dias: “Sibéria enfrenta onda de calor extrema sem precedentes (…). No último sábado, essa onda de calor quebrou um novo recorde preocupante, o registro de 38°C”*. Estamos falando de uma anomalia positiva de temperatura sem precedentes, nunca registrada antes. É importante sempre atentar-se para estes alertas e cenários agora para pensarmos e planejarmos o nosso futuro. * Fonte: https://www.tempo.com/noticias/actualidade/siberia-enfrenta-onda-de-calor-extrema-sem-precedentes.html
Para quem quiser acompanhar informações sobre o clima, acesse o website do LaboClima: http://www.terra.ufpr.br/portal/laboclima/