Marco Aloisio de Souza: Maestro rio-pardense reside há 35 anos na Holanda
Entrevista e texto: Natália Tiezzi. Fotos: arquivo pessoal
Amigos internautas, dando sequência às entrevistas do “Cadê Você?”, o www.minhasaojose.com.br traz nesta semana um pouco da história de Marco Aloisio de Souza, maestro rio-pardense que reside há 35 anos na Holanda, sendo 20 deles na capital, Amsterdã.
Enquanto morou em Rio Pardo, até os 16 anos, Marco cursou o Ensino Fundamental na E.E. “Dr. Cândido Rodrigues” e o Ensino Médio na E.E. “Euclides da Cunha”. Ele também estudou no Conservatório Musical “Maestro Francisco Cônsolo”.
Aliás, a música sempre se fez presente na vida do maestro e a clássica desde os 6 anos. Antes de viajar mundo afora, Marco teve grande influência musical por meio de professores também rio-pardenses, entre eles Didimo Siqueira e Maria Tereza Ratti de Oliveira.
Após sair de São José, o maestro passou pela Itália, voltou para o Brasil, residiu em São Paulo, Campinas, onde estudou regência na Unicamp, passou 4 meses em Basiléia, na Suíça e emigrou para a Holanda.
Sobre seus trabalhos, Marco é diretor da Fundação Leerorkest, em Amsterdã, que desenvolve projetos de Educação Musical junto a crianças imigrantes da periferia e que se estendeu para todo reinado, bem como no Caribe, em Curaçao, Bonaire e Aruba, que também fazem parte do reinado holandês.
O maestro também é formado em Viola da Gamba, um instrumento barroco, pelo Conservatório de Utrecht e nos últimos anos tem se dedicado mais a toca-lo, inclusive em seu grupo musical, que participa de vários concertos na Holanda.
Ao longo do bate papo on line, ele contou momentos marcantes de sua carreira, bem como das saudades que sente do Brasil, em especial de São José, recordando um pouco das comemorações de Natal em família, inclusive ao lado do saudoso irmão.
Confira, abaixo, a entrevista na íntegra.
Marco, quando surgiu a oportunidade de morar fora e em quais cidades já morou?
Marco Aloisio de Souza: A primeira oportunidade aconteceu em 1980, quando fui para Florença, Itália. Pela segunda vez, em 1986, quando fui para Basiléia (Suíça), onde morei quatro meses e finalmente fui para Holanda, onde morei em Utrecht, e estou a mais de 20 anos em Amsterdã.
E como você foi parar em Amsterdã?
Quando fui para Amsterdã, em 86, estava fazendo o último ano de Regência na Unicamp. Sempre mantive a cidadania brasileira por opcão. Poderia ter me naturalizado holandês, mas os primeiros anos da vida de uma pessoa são os mais marcantes. Apesar de em 2014 ter até sido eleito “Cidadão do Ano” em Amsterdã, me sinto muito brasileiro: brasileiro, paulista e por influência do meu pai, quase mineiro…
Quando a música entrou em sua vida e por que optou em ser maestro?
A música entrou na minha vida quando nasci… Meus pais sempre cantavam em casa. Meu contato com música clássica aconteceu quando tinha 6 anos eu acho… Meu irmão mais velho, Sidnei e meu mentor, gahou uma vitrola a pilhas quando concluiu o ginásio só com notas dez. (Ele era o irmão inteligente). Meu irmão mais novo, o saudoso Anisio era o esportivo da família e eu era… o mais bonito! Além desta vitrola, ele ganhou uma assinatura daquelas coleções de discos clássicos que apareciam cada mês. Nós dormíamos juntos no mesmo quarto e antes de cair no sono o quarto se enchia do mundo mágico criado por Bach, Mozart ou Beethoven. Depois disso ganhei um violão de Natal e comecei ter aulas com o professor Dídimo Siqueira. Logo conheci a Maria Tereza Rati de Oliveira e o Alvinho. Eles estavam começando um conservatório musical e a Maria Tereza meio que me adotou… Mais tarde conheci o Renato Teixeira. Sem eles hoje minha vida seria totalmente diferente. Devo muitíssimo às chances que eles me deram! Tive a oportunidade de também ir para São Pauloter aulas com o violonista Henrique Pinto e Teoria com o maestro Osvaldo Colarusso (então regente do coro do Teatro Municipal de São Paulo). De lá entrei na Unicamp de onde, depois de cinco anos de estudos, parti para a Europa.
Antes da Holanda, você também regeu ou fez algum trabalho ligado à música no Brasil?
Sim, muitos. Tanto trabalho educativo, dando aulas de música, como regendo a camerata barroca de Campinas.
E quais são seus trabalhos atuais?
Nos últimos anos tenho me dedicado sobretudo a tocar Viola da Gamba, instrumento barroco em que me formei no conservatório de Utrecht), e como diretor de três fundações relacionadas à Educação Musical: uma escola de música, um programa nacional de educação musical e uma instrumentoteca com mais de 10.000 instrumentos, onde crianças menos afortunadas podem emprestar um violino, oboé, harpa, etc, de modo que tenham chances de aprender música. O mundo seria mais bonito, seguro e feliz se todos nós fizéssemos música juntos…
Qual foi o momento mais marcante de sua carreira?
Quando a atual rainha da Holanda visitou meu trabalho de Educação Musical para crianças imigrantes da periferia de Amsterdã e me convidou, na mesma semana, a visitá-la no Palácio e aconselha-la sobre um plano nacional de educação musical nas escolas holandesas. Marcante não tanto pela honra, mas, sobretudo, pelas chances que tive depois em continuar e ampliar meu trabalho.
O que é ser maestro para você?
(Risos). Na realidade a função principal do maestro é integrar todos os sons com características próprias em uma só peça musical. É uma questão de criar unidade musical e estilística. Isto significa criar chances para cada intrumento, dando lugar para cada músico se exprimir.
O que é o melhor e o que o pior em reger?
O melhor é quando o regente sente que ele e coro ou a orquestra totalmente estão unificados. Ninguém é menos ou mais importante do que o outro. O resultado é a música, integral como um corpo onde todas as partes trabalham juntas. O pior? O contrário, quando cada instrumento ou músico age solisticamente.
Qual é a principal diferença entre a valorização da cultura na Holanda e no Brasil?
Difícil de dizer porque vivo a muitos anos fora do Brasil, mas, sobretudo, acho que a Europa investe mais do que o Brasil na conservação do patrimônio cultural. De outro lado, eu acho que no Brasil há uma distância menor entre a cultura erudita e a popular. Pense por exemplo na qualidade da música brasileira com nomes como Tom Jobim, Vinicius de Morais e Chico Buarque. Na Holanda não há ninguém com esta estatura…
Para finalizar, qual é a sua maior saudade do Brasil ou daqui de São José? Qual foi a última vez que esteve por aqui?
Minha maior saudade de São José são dos almoços de Natal na casa da minha vó Maria onde a família participava. No quintal da casa meus tios fabricavam uma barraca enorme com lonas de cobrir caminhões e passávamos o dia inteiro comendo, falando e brincando. A mesa era improvisada com cavaletes e tábuas emprestadas da serraria do meu tio. Tenho saudades das noites de 24 de dezembro na casa da tia Neta e Nicinha, onde todos os primos se reuniam debaixo da árvore de Natal e ganhávamos um presentinho meticulosamente escolhido embrulhado nas semanas anteriores… Minha última estada em São José foi anos atrás quando meu querido irmão Anisio faleceu. Foi muito triste por ele ser tão jovem, mas também emocionante sentir como ele foi amado por seus alunos e amigos. O coração rio-pardense bate mais forte ainda nestes momentos…