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Maurício Feltran: Um cozinheiro moderno à moda antiga

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Ele deixou a Publicidade & Propaganda para se dedicar ao hobby que acabou se tornando profissão

Reportagem e texto: Natália Tiezzi Manetta

Seguindo uma tendência mundial, onde os homens estão cada vez mais assumindo as cozinhas de grandes restaurantes, São José do Rio Pardo também possui um chef, ou melhor, um cozinheiro, como ele mesmo prefere se identificar, que vem se destacando tanto no trivial, quanto na alta gastronomia. Nossa entrevista destaque de hoje contará um pouco da história, ao mesmo tempo curiosa e de muita coragem, de Luís Maurício Feltran, que deixou para trás uma carreira de anos na Publicidade para investir em um hobby: cozinhar.

O “ir para a cozinha” em recepções de amigos aos finais de semana se tornou passar pelo menos 10 horas por dia dentro dela em alguns restaurantes que, como destacou, teve a honra de trabalhar como cozinheiro.

O jeito irreverente, porém perfeccionista, faz de Maurício um cozinheiro moderno, já que coloca em prática técnicas e conceitos da alta gastronomia mundial, porém à moda antiga, pois alia o conhecimento ao que há de mais simples na cozinha: alho, sal e cebola, temperos que, segundo ele, são o segredo do sucesso quando o assunto é sabor.

Mas, até chegar ao comando da cozinha de um dos mais renomados restaurantes rio-pardenses, Maurício teve que, digamos, ‘dar a cara a tapa’. “Quando decidi que deixaria a carreira publicitária para me aventurar na cozinha profissional, minha esposa, Ana Beatriz Angelini Celeste Feltran quase teve um treco (risos). ‘mas você está louco’ – era o que eu mais ouvia! Todavia, embora diante de muitos obstáculos que sabia que enfrentaria resolvi arriscar e hoje posso garantir que sou muito feliz e realizado em servir aos outros. Aliás, acho que nasci para isso, servir, e o caminho encontrado para isso foi a cozinha”, disse. Confira, abaixo, a entrevista na íntegra.

Maurício, com quem aprendeu a cozinhar e desde quando essa verdadeira arte te chamou a atenção?

Maurício Feltran: Acho que gosto de cozinhar desde sempre (risos), porém, recordo-me do meu bisavô paterno, o saudoso Pedro Cury, que cozinhava muito nas casas dos amigos. Lembro que eu acompanhava todo o processo para fazer um de seus pratos mais apreciados, a dobradinha, além de rabada, galinhada, enfim. Acho que isso me despertou ainda mais o gosto pela cozinha. Depois dele, minha sogra, dona Neusa, também foi uma grande inspiração, além de minha avó, tias…

Quando decidiu deixar a Publicidade para investir na gastronomia?

Na verdade desde quando fui morar fora para estudar já assumi a cozinha da república! Também gostava de ir à cozinha para recepções familiares, principalmente para fazer churrasco e massas, pratos que me identifico até hoje. Mas um dos grandes desafios que acredito ter sido um divisor de águas na minha carreira foi um aniversário que fiz oito anos atrás. Uma amiga, que já havia frequentado algumas recepções e provado alguns de meus pratos, convidou-me para preparar o cardápio de seu aniversário, que era composto por comidas árabes. Confesso que conhecia muito pouco dos pratos, alguns nunca havia feito, muito menos provado. Peguei as receitas e, literalmente, devorei os livros. Preparei tudo e na hora da festa bateu aquele frio na barriga. Eu nunca havia cozinhado para tantas pessoas, cerca de 80 convidados! E assim que as pessoas começaram a se servir, ouvi alguns elogios. Convidados chegaram até mim para cumprimentar e pedir o telefone do ‘buffet’ para contratar-me. Acho que naquele momento adquiri confiança, pensei, repensei e decidi que cozinhar era o meu futuro profissional. Quando falei isso para a Bia ela quase infartou, mas me apoiou, aliás sempre esteve ao meu lado e se não fosse por ela hoje eu não estaria cozinhando!

E qual foi seu primeiro emprego na cozinha?

Foi em 2010 quando soube que iria abrir um novo restaurante na cidade, o Fartura. Fui atrás do proprietário, o Nacib, que nem mesmo conhecia, mas dei a cara a tapa e lhe pedi um emprego na cozinha. Ele foi duro na queda e não queria me dar a oportunidade. Foi então que lhe pedi para deixar eu preparar alguns pratos e servir para a família e funcionários. Deu certo! Depois disso assumi a churrasqueira e a parte de massas. Trabalhei lá por um ano, desde quando abriu até o encerramento das atividades. Foi um grande aprendizado para mim.

Onde trabalhou depois?

Em 2011 ingressei na cozinha da Stufa Pizza Bar e lá tive a oportunidade de trabalhar com o Adriano Rondinelli Muradi, filho do proprietário, senhor Evaldo, um jovem chef que me ensinou muita coisa nos três meses em que convivi com ele na cozinha. E, apesar de não ter feito curso, o Dri elogiava algumas técnicas que nem eu mesmo sabia que possuía. Após a saída dele, que foi abrir seu próprio espaço em Ribeirão Preto, assumi a cozinha da Stufa e lá permaneci até 2015.

Pratos triviais como lombo de porco, mandioca e farofa têm um sabor especial por meio do preparo de Maurício: “Carinho, amor, sal, alho e cebola” – como ele próprio definiu

Você fez algum curso de gastronomia?

Sim. Em 2012 iniciei um curso de gastronomia nacional e internacional no Instituto Gastronômico das Américas, em Ribeirão, com duração de dois anos. Além de ser reconhecido no território nacional, a certificação também vale para inúmeros países, o que me proporciona a honra de poder exercer a profissão de chef, embora eu goste mesmo é de ser chamado de cozinheiro, que é o que sou!

Atualmente, você é chef no Restaurante Tia Jô e no Bistrô Sanzé. Quando iniciou os trabalhos nestes estabelecimentos?

Em 2015 fiquei sabendo que havia uma vaga para cozinheiro no Tia Jô para o almoço e eu fui me candidatar à vaga. E assim aconteceu. Trabalhei na Stufa e Tia Jô por um tempo e depois assumi o Bistrô.

Como é trabalhar numa cozinha mais trivial, caseira, como a do restaurante e com o requinte da de um bistrô?

Acho que isso é o mais interessante. Na cozinha do Tia Jô tive a liberdade de colocar em prática algumas técnicas para elaboração de pratos com aquele gostinho de comida caseira mesmo, o que chamamos de ‘trivial com sabor’. Além disso, pude incoporar novas receitas, mostrando uma culinária tradicional, mas com um ‘toque de chef’, digamos assim. Já no Bistrô é uma cozinha mais elaborada, onde utilizo mais as técnicas da gastronomia nacional e internacional, mas também trazendo um pouco dessa regionalidade para pratos sofisticados e levando um pouco dessa sofisticação ao almoço nosso de cada dia no Restaurante, como o dia em que servimos carne de siri no Tia Jô. Foi um sucesso e uma satisfação oferecer um prato nobre num almoço comercial, uma verdadeira popularização da alta gastronomia e é isso que tentamos fazer em ambos restaurantes!

Qual o segredo do sucesso na cozinha?

Amor e carinho ao cozinhar e depois alho, sal e cebola. Essa é a base para o êxito nos pratos! Porém, é possível combina-los com tantos outros sabores, como as ervas, por exemplo. Nosso país é muito rico em aromas e temperos e sempre que posso alio o que o Brasil e o que São José têm de melhor nos pratos. Tanto no Restaurante como no Bistrô faço algumas releituras de receitas clássicas com ingredientes da nossa terra. O resultado é sempre muito positivo, pois é possível fazer essas variações sem perder a qualidade das receitas.

Qual comida mais gosta de preparar?

Assados e massas continuam sendo minhas preferidas, a exemplo do meu tortelli de abóbora, com mel, parmesão e salsinha. Mas adoro cozinha contemporânea, vegana.

Cozinhar é cansativo?

Sim, muito. Pois além de utilizar as técnicas gastronômicas tenos que ter em mente que aquele prato que estamos preparando fará parte de um dos momentos de maior expectativa do dia da pessoa, que é almoçar ou jantar. Já passei, 10, 12 até 18 horas em uma cozinha e sei que o ritmo é desgastante, entretanto atualmente conto com uma equipe nota 10, pois o cozinheiro não faz absolutamente nada sem pessoas comprometidas ao lado dele.

Qual é a sua maior satisfação em cozinhar?

Acredito que despertar os maiores prazeres, sensações e sentimentos nas pessoas por meio da comida. Ter um prato elogiado também é muito bom. Pessoalmente, gosto muito quando as pessoas dizem que minha dobradinha fica idêntica a do meu bisavô. Isso é uma honra! E confesso: uso muito os livrinhos de receita de minha avó, tias e da sogra para aprimorar minhas técnicas e receitas!

ABAIXO, ALGUNS PRATOS DE DESTAQUE ELABORADOS POR MAURÍCIO

E como você lida com as críticas?

Sempre fui muito transparente com relação ao meu trabalho, tanto que no Bistrô gosto de ir às mesas e ter esse feedback dos clientes. Na maioria das vezes ele é positivo, mas, sim, já recebi críticas e encaro como aprendizado para que eu possa sempre melhorar.

Algum momento marcante nestes anos dedicados à cozinha profissional?

Sim. Vou citar dois que realmente me fizeram acreditar ainda mais na minha profissão. Um deles aconteceu no Bistrô, onde um cliente pediu uma massa à bolonhesa, ‘caprichada’. Depois de desgustar o prato, esse cliente chegou até mim e disse: ‘Maurício, você me fez recordar o talharim que minha avó fazia. É o mesmo sabor e o mesmo carinho’. Quando ouvi isso me emocionei, pois consegui despertar essa memória afetiva por meio de um prato. Outro momento foi quando entregamos um prato a uma criança que estava internada na Unimed, a qual fornecemos a alimentação, e dias depois sua mãe veio até o restaurante e quis falar comigo. ‘Você foi o responsável por minha filha comer feijão. Ela adorou e estou aqui para levar uma porção para casa, pois ela está pedindo’. Quase chorei ao ouvir isso. Como é bom despertar esse sentimento também nas crianças, um público que adoro cozinhar!

Para finalizar, o que espera para o futuro?

Tenho alguns projetos que quero colocar em prática. Um deles neste ano, com um programa de rádio, além de ter novamente a oportunidade de trabalhar com a alta gastronomia. Também estou estudando sobre vinhos e desenvolvendo vinagres aromatizados. Um dos meus sonhos futuros é ter o meu próprio restaurante, mas não aqui em São José, em outro município turístico que ainda não sei – mas isso é sonho para daqui uns 15 anos!

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