Outubro Rosa: Dr. Uanderson Resende conta sua história na Oncologia e alerta ao Câncer de Mama
Entrevista e texto: Natália Tiezzi Manetta
Neste 1º de outubro inicia-se com mais ênfase a Campanha Outubro Rosa, que objetiva a conscientização e prevenção ao câncer de mama, atualmente o que mais acomete as mulheres no Brasil. Para falar um pouco sobre a doença, o www.minhasaojose.com.br convidou o médico oncologista Uanderson Resende, um dos maiores especialistas no assunto. Graduado pela Unicamp, com especialização em Clínica Médica e Oncologia Clínica, com Doutorado em Oncologia Mamária (Unicamp), ele atua há décadas na prevenção, tratamento, seja para salvar ou prolongar a vida ou reduzir o sofrimento de seus pacientes.
Ao longo da entrevista, Uanderson contou sobre o que o levou a optar pela Medicina Oncológica, locais onde já trabalhou, incluindo seu mais novo trabalho na Operadora SAVISA, e o que é o melhor e o que é o pior nesta área onde o médico chega a dedicar-se praticamente em tempo integral.
Na segunda parte da matéria, o médico falou exclusivamente sobre o câncer de mama, sua incidência em mulheres, mas também em homens, diagnóstico precoce e prevenção. Confira, tire suas dúvidas e conscientize-se: o câncer de mama deve ser falado, entendido e prevenido!
Natália: Dr. Uanderson, por que optou pela Medicina Oncológica?
Dr. Uanderson Resende: Encontrei na Oncologia uma área de atuação em que me senti útil em ajudar as pessoas com grande sofrimento através dos meus conhecimentos. Através de meus conhecimentos na Oncologia, eu posso atuar clinicamente em muitos(as) pacientes com orientações clínicas sobre prevenção oncológica, realizar tratamento para curar um câncer, prolongar a vida ou reduzir o sofrimento daqueles que estão com doença avançada de forma digna.
Quais os locais/entidades onde o Dr. trabalha atualmente e em quais funções?
Atuo como oncologista clínico na Operadora SAVISA, no hospital Santa Lúcia de Poços de Caldas e na Unimed de Poços de Caldas. Sou Coordenador da residência de Clínica Médica do Ministério da Educação e Cultura (MEC) e da Especialização em Clínica Médica pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM) no Hospital Santa Lúcia de Poços de Caldas, Médico Legista da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais em Poços de Caldas e Professor concursado de medicina da Faculdade de Medicina da UNIFAE de São João da Boa Vista.
Quando e onde ocorreu sua primeira consulta a um paciente oncológico?
Na faculdade de medicina da UNICAMP durante meu internato. Naquela ocasião, percebi que a oncologia poderia ser minha futura especialidade médica, quando notei o drama das pessoas em tratamento com câncer. Senti que poderia ser útil nessa jornada.
Nestes anos de profissão, há algum momento que tenha lhe marcado e que possa contar?
Dezenas de histórias com dramas de sentimento infinito e único. Me recordo de dramas com um final feliz, pessoas que batalham e conseguem a cura. Mas também me lembro daqueles que batalharam, mas infelizmente não conseguiram a cura. Todos, sem exceção, são vencedores e vitoriosos, pois lutaram contra essa doença com tudo que possuem de melhor. E cabe a nós, profissionais da saúde, oferecer o que há de melhor de nós para curar ou amenizar todo esse processo.
O que é o melhor e o que é o pior em ser médico oncologista?
Melhor: é perceber que você fez de tudo ao seu alcance para um paciente, independente do resultado final. Queremos sempre curar todos os pacientes, mas sabemos nossos limites. Ter o sentimento de dever cumprido é uma gratidão conosco, que fizemos de tudo, seja no tratamento ou no acolhimento do paciente e sua família.
Pior: ocorre principalmente quando percebemos que não pudemos oferecer o melhor ao paciente. O sentimento de fracasso ou angústia ocorre quando percebe-se que poderia ter sido feito algo melhor do que o realizado, que fomos limitados pelas condições financeiras ou políticas, seja por recursos limitados do Estado, pela inoperância política, pela incapacidade de conseguirmos um medicamento não liberado pelo SUS, entre outros.
CÂNCER DE MAMA: VAMOS FALAR SOBRE ISSO?
Dr. Uanderson, o câncer de mama pode ocorrer em qualquer idade em mulheres e também em homens?
Não. Há dados de câncer de mama somente em mulheres e homens nas fases adulta e velhice.É importante dizer que homens podem ter câncer de mama, embora na proporção de aproximadamente 1% comparado às mulheres. Segundo, não há um tipo de câncer de mama. Pelo contrário, geneticamente há vários tipos, desde um câncer de crescimento muito lento levando até anos para crescer, até tumores extremamente agressivos com alto risco de produzirem metástases. O oncologista definirá o tipo de câncer de mama e o melhor tratamento a ser realizado. Em regra geral, com algumas exceções, o câncer de mama nas mulheres e homens idosos (acima de 65 anos) geralmente é de crescimento lento, e portanto, de melhor prognóstico. Por outro lado, o câncer de mama em mulheres com idade menor de 35 anos geralmente são agressivos e portadores de mutações genéticas familiares. Entre 35 anos e 60 anos temos uma grande abrangência de tipos de câncer de mama.
A partir de qual idade deve iniciar-se a mamografia?
A mamografia é o principal exame de rastreamento do câncer de mama. Chamamos de rastreamento o exame realizado para identificar lesões de câncer ocultas, ou seja, não identificadas à palpação, sem sintomas, sem sinais de presença. Portanto, é um exame realizado em pessoas assintomáticas. Nesse caso, a recomendação do Ministério da Saúde e do INCA é realizar a mamografia a partir dos 50 anos de idade. A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, a Sociedade Brasileira de Mastologia e outras organizações não concordam com esta idade inicial e recomendam iniciar a mamografia aos 40 anos de idade. Essa discórdia decorre de análises técnicas quanto ao resultado falso-positivo da mamografia. Ou seja, o exame de mamografia é um exame de alta sensibilidade, o que quer dizer que além de identificar muitas lesões de câncer de mama, também identifica muitas lesões benignas que foram falsamente interpretadas como câncer de mama. Quanto menor a idade de rastreamento, maior a chance de se identificar na mamografia uma lesão suspeita de câncer de mama, mas que na verdade se comprovará como uma lesão benigna. Outro ponto relevante a esclarecer é que a mamografia não confirma o câncer de mama. Apenas identifica a probabilidade de ser câncer de mama. É necessária a biópsia da lesão suspeita na mamografia para definir se é cãncer de mama, e principalmente definir o tipo histológico e molecular do câncer de mama, pois o tratamento do câncer de mama depende de saber qual o seu tipo. Outro ponto importante, é que a mamografia também é o exame inicial indicado para se investigar uma lesão tumoral suspeita no exame clínico, além do rastreamento. Outros exames complementares como ecografia da mama e axila, ou mesmo a ressonância magnética da mama e axila complementam o exame de mamografia caso o médico ache necessário.
O câncer de mama é o que mais leva as mulheres a óbito no Brasil? Por quê?
Atualmente o câncer de mama é o principal câncer nas mulheres no Brasil. Segundo o INCA, principal organização nacional nos dados estatísticos de câncer no Brasil, o câncer de mama representou cerca de 25% de todos os casos de câncer em 2018. Esses dados também estão presentes em todo o mundo. Estima-se que aproximadamente 2 milhões de novos casos de câncer de mama por ano. No Brasil, por exemplo, em 2020 estima-se cerca de mais de 66 mil casos novos, o que representa uma taxa de incidência de aproximadamente 40 casos novos para cada 100 mil mulheres. Em relação a mortalidade, o câncer de mama é a quinta causa de morte por câncer em geral, com cerca de mais de 600 mil óbitos. É a causa mais frequente de morte por câncer em mulheres. Na mortalidade proporcional por câncer em mulheres, no período 2014-2018, os óbitos por câncer de mama ocupam o primeiro lugar no país, representando cerca de 16% do total de óbitos, ou seja, 1 para cada 7 mortes. O pior é que esta taxa de mortalidade por câncer de mama, ajustada pela população mundial, apresenta uma curva ascendente. As principais explicações para estes números alarmantes são várias e complexas. No Brasil, ainda temos muitas falhas no rastreamento do câncer de mama por mamografias, diagnóstico do câncer de mama sendo realizado de forma tardia, com doença localmente avançada ou mesmo avançada, atraso no tratamento oncológico das pacientes, indisponibilidade de drogas modernas no SUS e em alguns convênios de saúde, falta de profissionais especializados ou de serviços de oncologia em lugares distantes, principalmente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, entre outros.
Qual a importância do diagnóstico precoce?
O diagnóstico precoce do câncer de mama, como por exemplo por meio de uma mamografia de rastreamento oncológico, permite identificar tumores de estádio inicial, ou seja, de tamanhos muito pequenos, cuja probabilidade de cura é altíssima. Também, tumores pequenos necessitam de tratamentos muito menos agressivos. Por exemplo, a cirurgia geralmente é conservadora da mama, com pouca chance de linfedema no braço; a radioterapia emprega dose menor de radiação sem necessidade de reforço; e por fim a quimioterapia pode não ser utilizada ou mesmo com doses e substâncias menos agressivas.
Há como prevenir o câncer de mama?
A prevenção do câncer de mama é a principal estratégia a ser adotada por qualquer serviço de oncologia. Diversas estratégias devem ser tomadas para a prevenção do câncer de mama, todas devem estar direcionadas para o tripé: acolhimento da equipe médica e interdisciplinar, conhecimento sobre a doença e a prevenção deve ser divulgado em todas as mídias, e oferta de exames iniciais de rastreamento médico. Portanto, um serviço de oncologia deve programar campanhas de prevenção oncológica para esclarecimento da comunidade local, acolher de maneira interdisciplinar e ampla todos os pacientes que procuram o serviço, e investigar todos os pacientes com suspeita de câncer. No caso do câncer de mama, deve ser orientado o auto-exame da mama, realizado o exame clínico da mama e axila, providenciar mamografia e outros exames que se fizerem necessários, e em caso de alta suspeita de câncer de mama, rapidamente providenciar a biópsia. Em caso de câncer de mama confirmado, o tratamento multidisciplinar deve ser programado e prontamente realizado. O acolhimento do paciente e seus familiares é providencial nessas circunstâncias.