Setembro Amarelo: Psicóloga Aline Faria enfatiza: “Quem cuida da Saúde Mental cuida de todo o restante”
Entrevista e texto: Natália Tiezzi
Neste Setembro Amarelo, mês de conscientização e prevenção ao suicídio, um tema que ainda (e infelizmente) é tabu para se expor, o www.minhasaojose.com.br conversou com a psicóloga Aline Faria para esclarecer alguns pontos sobre o importante assunto.
A profissional, graduada há 18 anos e pós graduada em psicologia clínica, com formação em psicanálise, destacou alguns pontos como o aumento da taxa de suicídio entre os idosos.
Ela também observou fatores de risco que podem desencadear comportamentos e doenças que levem à prática, que não são apenas emocionais, mas socioculturais e até ambientais.
Aline chamou a atenção para sinais que podem ser identificados em pessoas que estejam passando por situações que possam leva-la ao suicídio e enfatizou que quem quer cometer este triste ano fala sobre isso, e é exatamente por isso que é tão importante estar atento a quem, muitas vezes, está ao nosso lado sofrendo e necessitando de ajuda.
A psicóloga falou, ainda, que a psicoterapia pode auxiliar para a diminuição dos tristes índices de suicídio. “Através dela auxiliamos o paciente na busca pelo autoconhecimento como uma ferramenta importante para identificação de como ele pensa e age, quais são as suas emoções, seus medos, padrões que são reproduzidos e que podem já estar prejudicando este indivíduo sem ele nem saber”, afirmou.
Mexer onde dói, ‘quebrar padrões’ socioculturais, expor fraquezas. Tudo isso faz parte do ‘se conhecer’, que está diretamente ligado a ter ou não ter saúde mental, tão necessária não apenas para evitar a prática suicida, mas para se ter qualidade de vida. “Está cada vez mais provado que quem cuida da saúde mental cuida de todo o restante”, enfatizou Aline.
Confira, abaixo, a entrevista na íntegra.
Aline, por que setembro foi escolhido o mês de conscientização e prevenção ao suicídio?
Aline Faria: Setembro é o mês dedicado a campanha setembro amarelo que visa conscientizar sobre o suicidio. Foi escolhido setembro devido ao dia 10/09 ser o dia mundial da prevenção do suicidio.
Hoje, qual é a maior causa do suicídio no Brasil?
O suicídio é relacionado a diversos fatores que incluem ambientais, socioculturais e existenciais.
Os transtornos mentais como depressão, transtorno por uso de drogas ou álcool são fatores de risco importantes para o ato. Além destes, incluem-se traumas e bullying (que notamos muito em adolescentes). O aumento de desigualdade sociais e da pobreza com o crescimento da prevalência de transtornos mentais também são riscos ligados a suicídios.
Qual a faixa etária, sexo e condição social que mais pratica este ato?
É importante falar que qualquer pessoa independente do gênero, idade, condição social ou mesmo religião pode passar por problemas que a leve a pensar sobre o suicidio. Porém segundo dados do ministério da saúde os índices são maiores entre os homens. E os adolescentes em relação a faixa etária. Porém houve um aumento também em relação aos idosos.
É verdade que o número de suicídios cresceu nos últimos anos, principalmente devido à pandemia? Por quê?
Sim, acredito que a pandemia foi um período muito marcado pelo medo, sofrimento com as mortes de parentes e amigos e também pelas mudanças na economia, especialmente com o desemprego, que afetou pessoas.
Como saber se estamos precisando de ajuda profissional? É somente quando temos algum pensamento em ‘tirar a vida’?
Não é somente quando estamos com pensamentos suicidas, mas nesse caso é urgente a busca por ajuda, principalmente profissional que incluiu a psiquiatria. Porém, quando você tem algum tipo de prejuízo em relação ao seu dia a dia está na hora de buscar ajuda. Isso inclui não conseguir dormir, muita irritabilidade, explosões de raiva, muita frustração, não conseguir se relacionar, senso crítico alto. Fora as questões de ansiedade que hoje parecem estar normalizadas, crises diárias, sensações muito ruins com tudo, que fazem as pessoas limitar a vida. Tudo isso prejudica o dia a dia mas elas se “acostumam” e vão vivendo mal, desenvolvem problemas emocionais e muitas vezes nunca buscam ajuda para melhorar e viver melhor.
Como familiares e amigos podem identificar que uma pessoa precisa de ajuda antes dela cometer o ato em si?
Precisamos entender que todos nós podemos passar por problemas que prejudique nossa saúde mental. É muito importante prestar atenção em mudanças de comportamentos, isolamentos, pessoas que se fecham, ficam muito mais caladas do que normalmente eram, crises de choro, episódios de irritação e agressividade. Sentimentos de desesperança muito típico da depressão, que é quando a pessoa não tem perspectiva sobre o futuro, não faz planos. Desejo de morte que podem aparecer até em brincadeiras. E é importante a atenção a qualquer tipo de ameaça, pois não existe um olhar para problemas mentais como brincadeira, qualquer tipo de frase ligada a morte precisa ser levada em consideração.
É verdade que quem suicida ‘não fala’ que vai fazer isso? Ou ela dá indícios? Quais seriam?
Não é verdade! Pode-se falar muito sobre isso, como um pedido de ajuda mesmo, e é importante que toda situação seja levada em consideração e nunca como só uma ameaça ou chantagem emocional. Não acredite que quem ameaça não faz. Isso não é uma realidade. As doenças mentais são graves e podem levar a morte.
Como a psicologia, a psiquiatria, terapias auxiliam essas pessoas que chegam a este ‘fundo do poço’?
Através da psicoterapia, que é um espaço de escuta ativa e livre de críticas, onde auxiliamos o paciente na busca pelo autoconhecimento como uma ferramenta importante para identificação de como ele pensa e age, quais são as suas emoções, seus medos, padrões que são reproduzidos e que podem já estar te prejudicando e você não sabe. Quais são suas inseguranças e como elas contribuem para suas ansiedades. Além de ajudar a fortalecer sua confiança, auto estima e amor próprio, e formas de enfrentar seus medos, também é um espaço para o acolhimento dessa dor que nesse momento o paciente está sentindo. Quando estamos em sofrimento não existe mais nada no mundo do que aquela dor. Para Nietzsche, a dor pode deixar de ser algo ruim para se tornar uma força. E nos, profissionais de psicologia estamos aqui para auxiliar o paciente nesse caminho de transformar essa dor em força para se sair do fundo desse poço.
A vergonha, o medo ainda são empecilhos para que as pessoas busquem ajuda para cuidar da mente?
Além do medo de mexer onde dói, ou mesmo tirar a cortina daquilo que não quer ser visto, eu diria que o preconceito e ainda alguns conceitos errados sobre as emoções são empecilhos na busca pela ajuda. Conceitos como expressar emoção, ou o sentir é fraqueza e que ser forte é não sentir ou esconder o que sente, principalmente os homens aprendem isso e isso não é verdade. Até porque somos seres emocionais, que não temos controle sobre nossas emoções, e sim sentimos mesmo quando não queremos, choramos quando não queremos, expressamos quando não queremos e assim somos. E isso não nos torna fracos, só no faz humanos. E está cada vez mais provado que quem cuida da saúde mental cuida de todo o resto.
Para finalizar, independente de termos uma saúde mental doente ou não é recomendada a terapia a partir de qual idade?
Não há idade mínima para fazer terapia, para qualquer pessoa, independentemente da idade, pode ser muito benéfico um atendimento psicoterapêutico. A terapia pode ser feita em qualquer momento da vida. Cada fase tem suas particularidades, o que significa que os problemas, conflitos e dúvidas também são diferentes, e é importante reforçar que não há a necessidade de ter um transtorno mental para vivenciar o processo. Você pode optar por procurar o auxílio psicológico simplesmente porque deseja melhorar a sua saúde mental.